O entusiasmo e a confiança no potencial do sector transpareceram claramente do evento organizado pela Microsoft na semana passada. O Game Dev Camp contou com mais de 400 participantes e o objetivo declarado era mostrar o que de melhor se faz em Portugal no
desenvolvimento de
jogos e apps
para a nova geração de plataformas, mas também partilhar experiências e criar excitação numa nova geração de programadores.
"Acreditamos que o próximo grande jogo, ou grande App, pode ser criado em qualquer lugar, por qualquer pessoa ou empresa", defende Miguel Vicente, da Microsoft, responsável por fazer a ponte entre os programadores e a comunidade de TI e a empresa através de várias iniciativas.
Nos últimos anos registou-se um "crescimento extraordinário desta indústria em Portugal", refere, apontando que este acontece em todos os sectores, desde o cimentar dos casos de sucesso,
como a Biodroid, às startups que lançam novos projetos de potencial mundial, casos da Bica Studios ou Artbit Studios, ou o
desenvolvimento com uma forte identidade nacional, caso da Nerdmonkeys. Mas há também novos projetos ambiciosos que vão desde Massive Multiplayer Online RPGs,
como o Minimon3D, ou
jogos que exploram áreas que vão além dos ecrãs normais,
como o projeto "Cosmonaut" da We Came From Mars que usa Oculus Rift e Kinect.
"Sente-se uma ambição e energia no ar que fervilham, e estamos certos que muito em breve vamos ter o nosso próximo grande sucesso mundial, o tal que nos vai colocar no mapa", sublinha Miguel Vicente.
A ideia é partilhada por Ivan Barroso, designer de
jogos e investigador nesta área, com um livro publicado sobre a História dos Videojogos. "Nos últimos anos o crescimento de Portugal tem sido quase alucinante. A título de exemplo, neste momento, entre 2010 e 2014 já fizemos mais
jogos do que na última década, não só em termos de quantidade, mas também em qualidade", justifica.
Os números servem
para sustentar o
desenvolvimento que se pode observar em estúdios de dimensão já assinalável, startups e projetos individuais. "Estamos provavelmente a viver o terceiro boom da produção em Portugal. Depois da euforia nos anos 80 no Spectrum, a exaltação do mercado mobile e online no início do milénio, estamos agora talvez a viver uma nova Era" admite o investigador que lembra que nunca faltou massa crítica em Portugal
para o
desenvolvimento de jogos.
Então o que falhou até agora? Ivan Barros acredita que foi a capacidade de comunicação e distribuição. "Nos anos 80, 90 e até mesmo no início do milénio, a não ser que o nome do jogo estivesse em português, ou os autores tivessem assinado o jogo, raramente sabia-se que os
jogos eram portugueses, e muito dificilmente chegavam a ter reconhecimento na comunicação social portuguesa (quanto mais a internacional)", exemplifica.
Pelo caminho ficaram casos
como a Flying Turtle, Seed Studios ou Clueless ideas, "estúdios com títulos qualitativos e até premiados, mas que sem os apoios necessários saíram do mercado", adianta Ivan Barros, recordando que a partir de Portugal se desenvolveram tecnologias inovadoras, na produção de hardware no tempo do Timex Sinclair, a criação de rotinas
para jogos no Spectrum, até as novas formas de abordar o online,
como no Undercover 2: Merc Wars.
Mas este é um erro que não se está a repetir. Atualmente já há empresas a reconhecer a importância do marketing num projecto, e
como prova disso ganham destaque em vários meios, em Portugal e no estrangeiro, refere, dando
como exemplos os casos da Bica Studios, Wingz Studio, GS78 e a Nerd Monkeys.
Para além da qualidade e da criatividade, a capacidade de atrair investimento e de rentabilizar o
desenvolvimento é relevante e Ricardo Flores, Head of Games da Biodroid, defende que é preciso gerar massa crítica e interesse dos privados mais do que procurar apoios estatais. A empresa está no mercado há sete anos e tem no portfólio títulos
como o Billabong Surf Trip ou o MegaRamp Skate Rivals e o The Activision Decathlon, estando a preparar um jogo
para a nova geração de consolas, que já foi notícia no TeK.
Com o sucesso chega a rentabilidade e neste momento já há capacidade de fazer dinheiro a partir do
desenvolvimento de videojogos em Portugal, principalmente nos
jogos móveis, embora não com enfoque apenas no mercado nacional. "O importante nos nossos dias é ver os videojogos
como um serviço, um serviço de entretenimento. Já não os podemos encarar apenas
como um produto que uma vez acabado se lança e trabalho terminado passamos
para o próximo", explica, admitindo que nos últimos sete anos a Biodroid teve de se adaptar a novos modelos, uma "experiência dolorosa", que passou por muitos erros e projectos que falharam.
Ricardo Flores o ajustamento levou a que a Biodroid tenha agora uma equipa de Marketing e Produto que acompanha o
desenvolvimento desde a pré-produção ao pós-venda. "Somos hoje uma empresa de serviços o que fez aumentar a rentabilidade dos nossos projetos", destaca o responsável pela área de jogos.
Ainda a dar os primeiros passos, e a preparar o lançamento internacional do primeiro jogo, a Bica Studios, faz contas às métricas e avalia o feedback dos jogadores, mas quer ter uma palavra a dizer no competitivo cenário internacional.
A equipa do estúdio dá
como exemplo o mercado britânico
para defender que deveria existir maior apoio governamental
para ajudar a criar massa crítica na área de
jogos em Portugal e apoiar as startups. "Numa altura que se fala tanto em exportação é inacreditável a falta de atenção a este meio tecnológico que garante uma distribuição sem precedentes em termos de custos e eficácia", adiantam ao TeK, lembrando que a Europa é neste momento líder em
jogos mobile e que Portugal não deve ficar
para trás.
Depois de citarem os bons exemplos da Finlândia com o Angry Birds e o Clash of Clans, da Dinamarca com o Subway Surfers e o Candy Crush da Inglaterra, a equipa do Bica Studios defende que "temos pessoas capazes de fazer o mesmo. Só falta os incentivos, os apoios
para assegurarem uma aposta mais segura nesta área".
Escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico
Fátima Caçador